Extrema-direita espanhola articula internacional anticomunista que avança para América Latina
15 de março de 2022 - 14h02
Extrema direita espanhola ressuscita sonho imperial e caminha para América Latina
Por Mauricio Durá
Por motivos históricos próprios, diferentemente do resto da Europa, Espanha e Portugal vinham resistindo à entrada da extrema-direita em seus parlamentos. Mas, no último período, essa realidade mudou. Hoje, a extrema-direita já formou bancadas nos parlamentos dos dois países.
No caso da Espanha, o partido VOX conta com 52 deputados, em um parlamento de 350, constituindo-se como a terceira força política.
Pesquisas eleitorais mais recentes sobre o pleito que ocorre este ano indicam um possível empate com o Partido Popular (direita tradicional), disputando com este o papel de líder da oposição ao atual governo socialista.
O crescimento exponencial, em apenas cinco anos, projetou o VOX como uma referência entre os partidos da extrema-direita europeia e alimentou a volta aos tempos do Império Espanhol.
Na esfera europeia, Santiago Abascal, presidente do VOX, vem tentando jogar um papel no objetivo de dotar este movimento de uma maior organização e articulação, em torno de um projeto comum para a Europa.
Neste espaço, divide o protagonismo com figuras muito mais consolidadas, como é o caso dos primeiros-ministros Viktor Orbán, da Hungria, e Mateusz Morawiecki, da Polônia.
E neste contexto, que o VOX organizou no dia 28 de janeiro a denominada Cumbre de Madrid, que reuniu a extrema-direita europeia.
O evento viu suas expectativas, surgidas no encontro, limitadas pelos tambores da guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Não é um bom momento para lembrar do amigo Putin.
Foro de Madrid: uma internacional anticomunista para a América Latina
Em paralelo a estes movimentos na Europa, o VOX promove uma internacional anticomunista na América Latina. O ponto de partida propagandístico foi a Carta de Madrid, elaborada em outubro de 2020, e assinada por mais de oito mil pessoas entre políticos, empresários, integristas (católicos e evangélicos), neocons e ultraliberais, populistas de direita e nostálgicos das ditaduras militares.
Entre os integrantes desta iniciativa estão figuras amplamente conhecidas como Keiko Fujimori (Peru), Eduardo Bolsonaro (Brasil), José Antonio Kast (Chile) e Andrés Pastrana (Colômbia). Este último ocupa a presidência desta nova organização internacional, que tem por nome Foro de Madrid, numa referência direta e de contraposição ao Foro de São Paulo, tal e como se indica na Carta de Madrid:
“Uma parte da região está sequestrada por regimes totalitários de inspiração comunista, apoiados pelo narcotráfico e outros países. Todos eles, sob o guarda-chuva do regime cubano e iniciativas como o Foro de São Paulo e o Grupo de Puebla, que se infiltram nos centros de poder para impor sua agenda ideológica. A ameaça não se circunscreve exclusivamente aos países que sofrem o jugo totalitário. O projeto ideológico e criminoso, que está subjugando as liberdades e os direitos das nações, tem como objetivo introduzir-se em outros países e continentes, com a finalidade de desestabilizar as democracias liberais e o Estado de Direito”.
Nas palavras de Abascal, o Foro de Madrid é “uma estrutura permanente e com um plano de ação” que, tem como objetivo “ser alternativa ao Foro de São Paulo e ao Grupo de Puebla”, em referência à esquerda e à social-democracia na região.
Ao longo destes dois anos os dirigentes do VOX percorreram toda a região para promover esta iniciativa. A figura mais visível tem sido o eurodeputado Hermann Tertsch, que faz uso da infraestrutura de sua condição de eurodeputado e de terceiro vice-presidente da delegação europeia na Assembleia Parlamentar Euro-Latinoamericana, a Eurolat, que reúne deputados do Parlamento Europeu e de 23 países da América Latina.
Além disso, o grupo ultraconservador ECR (Reformistas e Conservadores Europeus) montou seu próprio “Eurolat”, do qual Tertsch é o presidente. Outra figura importante tem sido o deputado Coello Portugal, vinculado a grupos integristas católicos. Ele é o porta-voz do VOX na Comissão de Assuntos Exteriores do Congresso Nacional da Espanha.
Nestes périplos, em janeiro de 2020, estiveram na Bolívia, com ministros da golpista Jeanine Añez; posteriormente na posse de Guillermo Lasso no Equador, e na Colômbia foram recebidos pelo ex-presidente Álvaro Uribe. No México foi o próprio Abascal quem apresentou no Senado a Carta de Madrid, aproveitando o fato de ter sido convidado para um ato anti-abortista.
Recentemente, nos dias 18 e 19 de fevereiro, e no meio da pré-campanha presidencial na Colômbia, realizou-se em Bogotá o Primeiro Encontro Regional do Foro de Madrid. Num evento catalogado pelos organizadores como “histórico”, participaram figuras destacadas como o ex-presidente de Colômbia, Álvaro Uribe; o ex vice-presidente do Peru, Francisco Tudela; a coordenadora de Vente Venezuela, María Corina Machado; o ex-ministro das Relações Exteriores do Brasil, Ernesto Araújo; o escritor venezuelano Alejandro Peña Esclusa; deputados peruanos, de quatro partidos diferentes, Rosangella Barbarán, Wilson Soto, Diana Gonzáles Delgado e Alejandro Muñante, e as senadoras da Colômbia pelo Centro Democrático, María Fernanda Cabal e Paloma Valencia.
No espírito da Carta de Madrid o encontro finalizou com a leitura da Declaração de Bogotá, que apresenta, entre outras, as seguintes ideias:
- Nossa profunda condenação à agressão do terrorismo urbano, perpetrada pelas turbas do ódio, da intolerância e da violência comunista, seguidoras de Gustavo Petro;
- Denunciar que as máfias do narcotráfico e dos grupos terroristas pretendem apoderar–se da Colômbia nas próximas eleições, com o apoio do regime venezuelano, buscando obter pelos votos o que não conseguiram depois de 60 anos de violência comunista;
- Que existem sérios riscos às democracias da região, através dos projetos que pretendem entregar a Colômbia às máfias do narcotráfico e instaurar o comunismo no Brasil, nas próximas eleições presidenciais;
- Que o comunismo vem-se organizando em espaços como o Foro de São Paulo e, mais recentemente, através do Grupo de Puebla, depois de minar durante décadas as democracias liberais da região;
- Censurar a campanha internacional de desprestígio que se promove contra o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, campanha que busca interferir nas próximas eleições, para entregar o poder ao Foro de São Paulo e retornar ao modelo de corrupção que representa Lula da Silva, que havia sido superado;
- Respaldar a OEA e, particularmente, a seu secretário geral, Luis Almagro, frente às pretensões do Grupo de Puebla, de dissolver essa organização, para substituí-la pela Celac;
- Impulsionar projetos que sirvam para difundir e consolidar a cultura judaico-cristã ocidental em ambos os lados do Atlântico, para combater a guerra cultural marxista, que busca demolir os cimentos da nossa civilização.
Maurício Durá é sociólogo formado pela USP (Universidade de São Paulo), consultor de Políticas Públicas para a América Latina e correspondente do Holofote na Espanha