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ATAQUE

Terceira via é arquiteta do caos que jogou parte dos brasileiros no colo do bolsonarismo

Bolsonaristas querem romper com a ordem democrática

30 de maio de 2022 - 12h14

Terceira via e a síndrome de Lampedusa

 

Por Rubens Sawaya

“Se quisermos que tudo continue como está, é preciso que tudo mude” (“O Leopardo”, de Giuseppe Tomasi di Lampedusa 1896-1957).

Seria inaceitável que outros comprem o “Centrão” e controlem o Congresso. Com esse propósito foi extinto o esquema dos “Anões do Orçamento” nos anos 1990, como relatado em “3000 dias no bunker” (Fiuza, G. 2006).

É claro que não é possível governar sem ter o controle do fisiologismo parlamentar representado pelos políticos profissionais do “Centrão” – PMDB, PFL, DEM, e outras legendas de aluguel que garantiam o acesso aos recursos e a aprovação de determinadas medidas. Inclusive, vale lembrar, Bolsonaro participava do esquema como eminência parda, político de terceira linha.

Os donos do poder de 1990 sabiam que só conseguiriam o controle da política para implantar sua agenda neoliberal com o controle sobre o Congresso pelo poder do dinheiro, sem intermediários.

Talvez esse seja o verdadeiro sentido do mote “fim das ideologias” que ganhou as eleições em 2018. Sem “ideologia” sobra apenas o amor ao dinheiro e, quem tem o dinheiro para pagar, tem o poder. Assim, se poderia acabar com as políticas que favorecem outros interesses –como os sociais, trabalhistas, chamados sempre de “populistas” – que não os do poder econômico das elites.

Talvez o ódio das elites ao PT tenha origem em sua tentativa de quebrar o esquema e retirar o poder sobre a política das mãos dos poderosos financiadores de campanhas e seus caixas 2. Seria inadmissível usar o dinheiro para tentar governar e controlar o orçamento, para aprovar medidas ligadas às pautas sociais, muitas vezes contra o poder das elites.

Mesmo com todas as concessões do PT – como deixar o controle do Banco Central sob o poder dos detentores do dinheiro em todo seu governo e, no final, colocar o cavalo de Troia Levy indicado pelos Bancos para tentar salvar Dilma do impeachment – não foi possível desviar o ataque.

Com o golpe de 2016, as tradicionais elites que sempre controlaram a política pelo poder do dinheiro achavam que tinham definitivamente tirado esse incômodo PT de cena, partido que cismava em ter pauta própria não só social, mas de controle sobre a Petrobras em benefício social e econômico (construção de cadeias produtivas nacionais) após a descoberta do pré-sal.

Mesmo com o massacre midiático, o PT e Lula continuavam não apenas vivos, mas na liderança das pesquisas em 2018. Não poderia ser por menos, após o fracasso Temer que destruiu o país criando a maior crise de sua história ao aplicar os princípios do “Uma Ponte para o Futuro”, do MDB de Simone Tebet, escrito por economistas ligados aos bancos e que hoje se engajam na “terceira via”.

Para não perderem o poder depois do golpe, em 2018 tiveram que colocar o principal candidato na cadeia, sem provas de corrupção.

Nunca conseguiram entender porque um político não havia posto o dinheiro de campanha no bolso, comprado mansões etc., como todos os outros. Teria usado esses recursos para fazer política e disputar o controle político do fisiológico Centrão com essas mesmas elites? Claro, esta seria uma postura inaceitável para os donos do poder e do dinheiro, uma afronta inaceitável às elites!

Aceitaram Bolsonaro no acordo com Guedes e sua promessa de manter a política da “Ponte”. E não faltaram elogios dos grandes bancos brasileiros a Guedes em reunião de Davos, no início do governo Bolsonaro, gritando “estamos com você”!

E assim foi feito. A Petrobras foi entregue ao “mercado, a privatização da Eletrobrás está em curso, as políticas sociais foram destruídas com a reforma trabalhista em completo à reforma previdenciária, em um radical corte de gastos que, afirmavam, “não cabiam no orçamento”, com a desvinculação dos gastos sociais do orçamento (proposta por Armínio Fraga em 2015, também no “Ponte”), com o encolhimento do BNDES como agente do desenvolvimento etc.

Os resultados não poderiam ter sido piores. Junto com a pauta econômica que defendiam, veio Bolsonaro e seu estilo brucutu demolidor que envergonha mesmo aos neoliberais da “Ponte”, os donos do poder financeiro, muitos “viúvos” da morte do PSDB, sua legenda de origem.

O desastre da aplicação do “Ponte para o Futuro” poderia não deixar sobreviventes. A sorte deles é que parece “culpa” do Bolsonaro e de Guedes, e não do malfadado projeto.

Desesperados com a perda de poder e controle sobre a política e os políticos, tentam criar de qualquer forma uma “terceira via”. Claro, com o mesmo programa e os mesmos economistas defensores da “Ponte para o Futuro” que agora se unem em torno dela.

Essa terceira via agrega banqueiros e empresários da “direita civilizada”, como afirma um dos financistas em apoio, em prol do mesmo projeto de sempre, corriqueiro na boca de economistas como Helena Landau – nos anos 1990 era chamada de “musa da privatização” –, Armínio Fraga, Zeina Latiff, entre outros apoiadores do “Uma ponte para o futuro”.

Claro que é sempre melhor uma direita se distanciando da aliança que ela havia construído com o bolsonarismo da destruição. Mas não é possível esquecer que foi essa mesma direita dita “esclarecida” que fomentou o golpe em 2016 por não se sentir mais no controle da política e dos políticos e por não ver seu programa ser implantado como afirmou o próprio Temer.

São os mesmo que apoiaram o lavajatismo que destruiu a estrutura produtiva do país ao atacar justamente os setores em destaque, como petróleo e sua enorme cadeia de valor, construção pesada e carnes de exportação.

Neste momento, o que está em debate é a democracia contra a imposição de determinadas políticas e interesses fundados no poder econômico que agora se manifesta como “salvador”, mas que vêm destruindo o país, empobrecendo a grande maioria.

Foi o golpe que essa direita realizou que acabou por construiu (e apoiar) o bolsonarismo. Este é o atual grupo de elites que se diz “terceira via”, “equilibrada e pacificadora”, mesmo depois de ter patrocinado o maior atentado contra as instituições e a democracia, jogando o país no caos.

 

Rubens R. Sawaya é professor do Departamento de Economia e da pós-graduação em Economia Política da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) e autor de Subordinated Development, transnational capital in the processo of accumulation of Latin America and Brazil, Brill/Hymarket, 2018-19.

 


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